Pedro Lucas
Sousa Dias Jocundo[1]
Cloves Augusto
Alves Cabral Ferreira²
Resumo:
Algo indubitável é
que a sociedade sempre está sofrendo mutações, não só nas maneiras de se
comportar, de se vestir, de falar, como também de pensar e viver. O papel do
Direito nessas mudanças é analisá-las e se adequar as transformações sociais
para criar um corpo social justo e
harmônico para todos ao seu redor, ajudando na evolução gradual do ser humano.
Uma das maiores mudanças é na família como um todo, na sua estrutura,
entidades, núcleos e, finalmente, no poder familiar, objeto de estudo deste
artigo. A comparação entre os modelos atuais e antigos desses institutos
mostra-se importante para o estudo do avanço no campo social e afetivo da
família, mostrando que é possível ter uma base social sólida, feliz e adequada
para os tempos modernos.
Palavras-chaves: Poder,
Família, Evolução, Direito
Abstract: There is no doubt that
society is always mutating, not only in ways of behaving, dressing, speaking,
thinking and living. The role of law in these changes is to analyze them and
adapt the social transformations to create a fair and harmonious social body
for everyone around them, helping in the gradual evolution of the human being.
One of the greatest changes is in the family as a whole, in its structure,
entities, nuclei and, finally, in family power, object of study of this
article. The comparison between current and former models of these institutes
is important for the study of progress in the social and affective field of the
family, showing that it is possible to have a solid, happy and adequate social
base for modern times.
Keywords: Power, Family,
Evolution, Law
[1]Bacharelando
em Direito, pela Faculdade da Amazônia Ocidental – FAAO. E-mail:
pedrolucas199611@gmail.com
²Doutorando em Direito
Constitucional pela Universidade de Fortaleza- UNIFOR, Mestre em Direito,
Estado e Sociedade, pela Universidade Federal de Santa Catariana- UFSC,
Especialista em Direito do Trabalho pela Universidade de Brasília- UNB,
Especialista em Direito Público pela Faculdade de Ciências de Pernambuco
–FACIPE, Especialista em Direito Constitucional – Universidade de Minas Gerais,
MBA em poder Judiciário pela Fundação Getúlio Vargas – FGV, Bacharel em
Ciências Jurídicas pela Universidade Federal de Rondônia –UNIR, Bacharelando em
Administração pela Universidade Federal de Brasília.
Introdução
O propósito que se
pretende alcançar com o presente artigo é realizar uma análise geral e crítica
do instituto do poder familiar no ordenamento jurídico brasileiro, mostrando
sua evolução desde o inicio até os dias atuais, expondo suas falhas, qualidades
e o que mais pode ser evoluído. O presente trabalho acadêmico usará de
doutrinas e exame de decisões judiciais acerca do tema tratado para uma analise
clara e objetiva, a fim de se chegar ao objetivo almejado.
Mostra-se muito
significativo esse estudo, pois é um tema que se demonstra de pouca relevância
no mundo acadêmico, mas que tem relevante destaque na realidade concreta, pois
aborda um dos assuntos mais importantes, tanto para o Direito Civil e
Constitucional, quanto para a configuração social, moral e estrutural de todo
Estado democrático de Direito que é a família.
Para alcançar o escopo
do presente artigo, foi dividido em três subdivisões: o primeiro pretende investigar
o conceito do instituto, sua evolução histórica e como é abordado no mundo
atual, o segundo pretende mostrar como o tema está sendo tratado no ordenamento
jurídico brasileiro, como pensam os doutrinadores sobre o poder familiar e
analisar decisões de magistrados sobre a asserção tratada, concluindo o estudo
da matéria com as considerações finais e um ponto de vista crítico e evolutivo
para que haja melhorias em respeito à tese questionada.
1.Conceito
e retomada histórica do poder familiar
O
poder familiar constitui na atribuição, constituída aos pais, enquanto seus
filhos são incapazes de exercer os seus direitos civis de cuidar, educar,
defender, guiar, alimentar, resguardar e transformar o ente em desenvolvimento
em seres humanos dignos e honrados. Em suma, é o poder dos progenitores para
educar o seu fruto no processo de desenvolvimento e crescimento espiritual,
racional e corpóreo de seus descendentes.Para completar esse raciocínio, Carlos
Roberto Gonçalves (2017, p. 535). ”Poder familiar é o
conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, no tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores.”
Entretanto,
para chegar a esse pensamento, houve décadas de estudo e evolução do pensamento
e comportamento humano e familiar, isso se dá pelo pensamento arcaico, machista
e simples do chamado “Pátrio poder”, que consiste no poder exclusivo da figura
paterna nas relações familiares, ou seja, o pai tinha todo o poder de decisão
sobre os quesitos relacionados à família, entendimento esse corroborado pelo
antigo Código Civil de 1916 no seu artigo 379: “Os filhos legítimos, ou legitimados, os legalmente
reconhecidos e os adotivos estão sujeitos ao pátrio poder, enquanto menores”.
O pátrio poder, no século XXI, mostra-se
vencido e superado, à vista disso nota-se o crescente crescimento da
importância da figura materna nas relações sociais, familiares e profissionais,
isso é, a figura feminina ganhando notoriedade no mundo, algo que, infelizmente,
não era possível até meados do século XX, onde a mulher só tinha o dever de
cuidar da casa e dos filhos.
Contrapondo-se ao aludido artigo 379 do
Código Civil de 1916, vem o atual diploma de 2002, em seu art. 1630 exemplificar que
“Os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores”. Nota-se apenas
a substituição de “Pátrio Poder” para “Poder Familiar” revelando sua evolução
no que tange a quem tem o direito de decidir nas questões dos filhos.
Importante salientar o termo “enquanto menores”, ou seja, enquanto os rebentos
não forem capazes de tomar as próprias decisões, enquanto não puderem gozar de
suas plenas capacidades e direitos na esfera civil.
Todavia, de nada adianta mudar o que está no
papel, enquanto não mudar o pensamento coletivo de que uma única pessoa é capaz
de tomar todas as decisões familiares. A sociedade enquanto um organismo
mutável, suscetível a mudanças, deve entender que não mais há um domínio
exclusivo do patriarcado. Os arbítrios familiares devem ser tomados em
conjunto, cristalizando o poder familiar e contribuindo para um crescimento
salutar dos filhos e da própria pessoa, enquanto Homo sapiens.
2.O PODER FAMILIAR NA PRÁTICA
O poder familiar na prática pressupõe a
analise aplicacional da realidade concreta do espectro teórico do tema em
questão. Para isso, far-se-á uma investigação de noticia ou jurisprudência a
respeito do conteúdo tratado.
A noticia a seguir foi retirada do TJ/AC,
como se segue ipsis
litteris:
“Justiça destitui poder familiar de pai biológico e concede a padrasto
guarda de enteada”
Criança expressou o desejo de ter o sobrenome do
autor que a cria desde aos três anos de idade.
O Juízo
da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco atendeu ao
pedido de um padrasto e autorizou a adoção da enteada, de 10 anos de idade. Com
a sentença, a criança, criada por ele desde os três anos de idade, receberá o
sobrenome do pai adotante.
O juiz
de Direito Romário Faria, titular da unidade judiciária, destituiu o poder
familiar do pai biológico da menina, mas preservou o vínculo da adolescente com
a mãe biológica, que após ter se separado do genitor da filha casou-se com o
requerente.
O
padrasto entrou com ação de adoção unilateral e destituição do poder familiar
do pai biológico, relatando conviver com a enteada há sete anos, desde quando
casou com a mãe dela. O requerente disse criar a menina como sua filha,
dando-lhe carinho e sustento necessário, e como a criança expressou o desejo de
ter o sobrenome dele, ele entrou com o pedido.
Assim, o
magistrado constatou, a partir da análise do relatório de estudo psicológico
favorável, diante da concordância da mãe da menina e do desejo da criança em
ser adotada, que a “adoção postulada apresenta real vantagem para a adotanda e
se funda em motivos legítimos”.
“Sendo
assim, visando o melhor interesse da menor e, ainda, as consequências negativas
da morosidade já estabelecida, hei por bem deferir a adoção pretendida, visto
constatar a demora na conclusão dessa adoção (…)”, asseverou Romário Faria.
O
magistrado ainda discorreu sobre a relação de afeto estabelecida entre a menina
e o padrasto. “No caso, houve uma consolidação das relações de afeto, derivado
da relação de convivência familiar, na qual ambos os interessados se consideram
pai e filha, ao contrário da relação da adolescente com o pai biológico, pois
ela não o conhece como pai, pela ausência da afetividade”, escreveu o juiz de
Direito”.
“Por
fim, o magistrado falou que nas relações paterno-filiais ou as materno-filiais
o afeto não é fruto da biologia, portanto, julgou procedente o pedido, e
determinou que após o trânsito em julgando o processo seja arquivado”.
Verifica-se
uma mudança significativa no tocante a família. Pensa-se no pátrio-poder e não
se consegue vislumbrar algo parecido com o conteúdo da referida noticia, isso
porque, anteriormente, a figura paterna reinava soberano nos lares brasileiros
e não havia espaço para mudanças.
Acertada
foi a decisão do magistrado no tocante aos seguintes motivos:
A
afetividade entre enteado e padrasto superou barreira sanguínea, nesse caso
especial. A criança detectou uma figura paterna salutar no esposo de sua
mãe,clara evolução no pensamento do Direito Civil brasileiro do Século XXI, no
tocante a família, que detectou esse pensamento e o acatou pelo bem da prole em
questão.
Foi
respeitado o principio da dignidade da pessoa humana, esculpido na carta magna,
no artigo 1°, inciso III, pois o padrasto substituiu de maneira competente a
figura do pai biológico, o que lhe deu respeito suficiente para ser o educador
da figura infantil em questão e a educanda irá crescer de maneira saudável e
meritória.
Outra
característica não mais peculiar mostrada no caso em epígrafe é que a menor
manifestou desejo de ter o sobrenome do padrasto em detrimento ao do pai
biológico. Isso reforça o quanto o novo ser que entrou na vida da jovem exerce
de maneira cristalina uma influencia sem precedentes em sua vida. Há,
literalmente, uma tentativa de se criar, no plano material, um “novo pai”, algo
jamais vislumbrado pelo CC de 1916, muito influenciado pelo pátrio- poder.
No meio
da noticia apresentada, mostra o principio do melhor interesse da criança, ou
seja, também houve respeito para com o que o menor sentia e queria, pois como
ser humano em desenvolvimento, não pode haver erros crassos para que o mesmo
não tenha traumas ou tristezas que possam o acompanhar pelo resto de sua vida.
O magistrado observou bem essa questão e aplicou o justo.
Para
embasar tais teses, cita-se o Art. 1638, CC:
I - castigar imoderadamente o filho; II -
deixar o filho em abandono; III - praticar atos
contrários à moral e aos bons costumes; IV - incidir,
reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.
V - entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção
O caso
apresentado encaixa no Inciso II do referido artigo do CC, pois o progenitor
biológico nem sequer foi citado como tentando reverter a situação de abandono
afetivo para com sua filha, reagiu de forma passiva e mostrou que não teve
importância alguma sobre o que aconteceria com sua descendente. Isso mostra que
não havia poder familiar algum em sua figura e que não sabia exercer tal função
com afinco e denodo o que causaria prejuízo existencial, cognitivo e espiritual
para a criança, não sendo alguém capaz de exercer de maneira eficaz seus direitos
e deveres perante a coletividade. Daí entra o famoso ditado popular dos dias
atuas que diz “Pai não é quem faz, pai é quem cria”.
Embasado em tal
citação empírica, não será incomum ver esse tipo de noticia ou decisão de
processos, não só sobre pai e mãe heterossexuais, mas pode-se alcançar tipo de
situação em qualquer tipo de família já que, não só o poder familiar mostrou
grato desenvolvimento, como os tipos de famílias são plurais, ou seja, dois
pais, duas mães, três ou quatro indivíduos criando de uma criança e assim
sucessivamente.
É notória a
evolução e revolução da família, tipos, poder, e constituição. Como já dito
nesse artigo, a sociedade e o ser humano individual evolui e é papel do direito
e seus operadores detectar essas mudanças e se adequar a elas, modificando
normas ultrapassadas e doutrinas obsoletas.
O poder familiar
é objeto de muita discussão ainda, pois muitos ainda não aceitam a mudança
significativa dos direitos e deveres de cada um perante a coletividade. O
presente trabalho não visou explicar a complexidade do tema e sim dar uma breve
introdução de pesquisa cientifica e despertar a curiosidade para delimitar
sobre tal assunto.
Na prática,
infelizmente, ainda tem-se muitos redutos familiares corrompidas com o vencido
pátrio- poder. Cabe a todos entender e mostrar um caminho melhor para que todos
os seres humanos cresçam e, juntos, sejam capazes de construir um povo
harmonioso e com interesses comuns, almejando e conquistando o progresso.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
Tribunal de Justiça do Acre. 2ª Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco autorizou o pedido de adoção por parte do padrasto.https://www.tjac.jus.br/noticias/justica-destitui-poder-familiar-de-pai-biologico-e-concede-a-padrasto-guarda-de-enteada/ Acesso em Outubro de 2018
Gonçalves, Carlos Roberto:Direito civil brasileiro, volume 06: direito de família / Carlos Roberto Gonçalves. – 14 ed.
– São Paulo: Saraiva 2017.
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