quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Artigo Acadêmico: A Justiça do Acre e a adoção em decorrência da perda do poder familiar.


Mirna Justa Nogueira 
Junior Monte 
Prof. Dr. Clóvis Augusto Cabral Ferreira 



RESUMO: O presente artigo cientifico tem como objeto de estudo o instituto da  adoção em decorrência da perda do poder familiar, bem como a sua importância no âmbito do Direito de Família, no que tange ao melhor interesse da criança e do adolescente, sendo estes aqueles que mais precisam de cuidados, proteção, afeto e orientação. Pretende-se apresentar aqui jurisprudências inovadoras que foram proferidas nos últimos anos, principalmente pela Justiça Acreana, em caso fático, onde o padrasto/pai afetivo ao invocar os princípios da dignidade humana e da afetividade e de melhor interesse da criança pode ver garantida a manutenção/estabelecimento dos vínculos parentais pelo reconhecimento de decisão judicial que retirou o poder familiar exercido pelo pai biológico. Para alcançar tal objetivo buscou-se utilizar metodologicamente de pesquisas doutrinarias e jurisprudenciais que reconhecem as mudanças sociedade e tratam especificamente sobre os reflexos que os novos arranjos familiares tem trazido para o âmbito do Direito de Família.

PALAVRAS-CHAVES: Adoção, Poder Familiar, Afetividade, Inovação, Justiça.

The present scientific article has as object of study the institute of the adoption as a result of the loss of family power, as well as its importance in the scope of Family Law, in what concerns the best interest of the child and the adolescent, being these the ones that more need care, protection, affection and guidance. It is intended to present here innovative jurisprudence that has been pronounced in recent years, mainly by Acreana Justice, in a factual case, where the stepfather / affective father, invoking the principles of human dignity and affection and of the best interest of the child can be guaranteed maintenance / establishment of parental bonds for the recognition of a court decision

that removed the family power exercised by the biological father. In order to achieve this objective, we sought to use methodological studies of doctrinal and jurisprudential that recognize the changes society and specifically deal with the reflexes that the new family arrangements has brought to the scope of Family Law

KEYWORDS: Adoption, Family Power, Affectivity, Innovation, Justice.



2.   INTRODUÇÃO

A palavra adoção deriva do latim adoptare, que significa o ato de escolher, de dar a seu nome a alguém, já o poder familiar é um instituto do Direito de Família, o  qual era conhecido como pátrio poder, chamado no Direito Romano de pater potestas, sendo o direito absoluto e ilimitado conferido ao chefe da organização familiar sobre a pessoa dos filhos.

Atualmente, o instituto da adoção, sob o aspecto jurídico, pode ser conceituado como ato jurídico solene pelo qual se cria um laço de filiação entre duas pessoas, com total desligamento do adotando de sua família biológica.

Mas é importante lembrar que até o século XX a adoção em nosso país não era regulamentada juridicamente, sendo o acesso ainda mais restrito, desse modo apenas os casais que não possuíam filhos biológicos é que de fato poderiam fazê-lo, e isso ocorria por meio da entrega de uma criança que fora deixada na Roda dos Expostos, onde eram abandonadas crianças até sete anos de idade e a última roda de nosso país ocorreu em meados de 1950 com o fechamento de tais instituições.

Esse costume deixava os casais e as crianças em situação de vulnerabilidade, pois nenhum direito sobre a adoção lhes era de fato assegurado. As crianças, por exemplo, não podiam receber herança de seus pais, a não ser que a família recorresse  ao poder judiciário e, em audiência, o juiz confirmasse o interesse de ambos na adoção.

Por volta do século XIX e início do século XX, algumas políticas públicas começam a ser criadas, sendo direcionadas objetivamente à proteção das crianças. Em 1916 é promulgada a Lei 3.071.16 que versava sobre o instituto da adoção, tal lei buscou regulamentava que a adoção somente poderia se dar nos moldes determinados

legalmente, como diferença de idade mínima de 18 anos, casamento civil para os que se consideravam casados, restringindo assim as possibilidades de pleito, deste modo só se adequavam aos critérios determinados os casais ou pessoas sem filhos, que tivessem idade mínima de 50 anos.

Previa ainda duas possibilidades de desfazimento do vínculo familiar, um se caso ambos assim concordassem, tendo a criança adotada atingido sua maior idade e outro em razão de ingratidão do adotado contra o adotante, o que não era esclarecido por lei, sendo diversos os critérios possíveis para isso.

Somente após quarenta anos é que a Lei 3.133 de 1957 trouxe mudanças importantes para o instituto da adoção, como a irrevogabilidade da adoção, isto é, ela não poderia mais ser desfeita, o desfazimento de vínculos com a família biológica, além permitiu a adoção por pessoas de 30 anos de idade, tivessem ou não prole natural.

O legislador passou a facilitar os processos de adoção, possibilitando que um maior número de pessoas, sendo adotado, experimentasse melhoria na sua condição moral e social, mas embora concedesse a adoção para casais que já tivessem filhos legítimos, legitimados ou reconhecidos, não equiparava a estes aos adotados, não se envolvendo aqui questões de sucessão hereditária.

Após isso, a Lei n. 4.655/65, nas palavras do doutrinador Carlos Roberto Gonçalves:
(...) introduziu no ordenamento brasileiro a “legitimação adotiva”, como proteção ao menor abandonado, com a vantagem de estabelecer um vínculo de parentesco de primeiro grau, em linha reta, entre adotante e adotado, desligando-o dos laços que o prendiam à família de sangue mediante a inscrição da sentença concessiva da legitimação, por mandado, no Registro Civil, como se os adotantes tivessem realmente tido um filho natural e se tratasse de registro fora do prazo (art. 6º) (GONÇALVES, 2017, p.492)

As atenções do poder público continuaram voltadas para a infância, e em 1979,  o Código de Menores é publicado, Lei n. 6.697/79. A adoção passa a ser incluída agora como uma medida protetiva da infância, não sendo encontrada dentro do direito de família. O ilustre doutrinador ainda aduz que:

Ao lado da forma tradicional do Código Civil, denominada “adoção simples”, passou a existir, com o advento do mencionado Código de Menores de 1979, a “adoção plena”, mais abrangente, mas aplicável somente ao menor em “situação irregular”. Enquanto a primeira dava origem a um parentesco civil somente entre adotante e adotado sem desvincular o último da sua família de sangue, era revogável pela vontade das partes e não extinguia os direitos e deveres resultantes do parentesco natural, como foi dito, a adoção plena, ao contrário, possibilitava que o adotado ingressasse na família do adotante como se fosse filho de sangue, modificando-se o seu assento de nascimento para esse fim, de modo a apagar o anterior parentesco com a família natural. (GONÇALVES, 2017, p.492)

Por fim, com a vigência da Lei n. 8.069/90, o conhecido Estatuto da Criança e do Adolescente promoveu uma nova mudança para fins de regulamentação do instituto da adoção, trazendo como principal alteração a regra de que a adoção seria sempre  plena para os menores de 18 anos, e a adoção simples ficaria reservada aos que já houvessem completado essa idade, sendo denominadas como adoção civil e adoção estatutária. Atualmente é a Lei n. 12.010/ 09 que rege o processo de adoção de crianças e adolescentes.



3.   UMA MUDANÇA DE PARADIGMA NO DIREITO DE FAMILIA

O Direito de Família vem se adaptando aos novos modelos de constituição familiar, não sendo diferente em relação à função do poder familiar, que ao não ser exercido com responsabilidade pode ser retirado daqueles que tem o dever de cuidar, proteger e zelar pelo bem estar do menor.

Sendo assim, o exercício do poder familiar deve ser guiado pelos princípios que regem o Direito de Família e o estatuto da criança e do adolescente, levando assim em consideração não apenas a dignidade da pessoa humana, a igualdade, respeito, a diferença e a liberdade, mas também a proteção integral a criança e do adolescente, evitando-se o retrocesso familiar e elucidando cada vez mais a afetividade existente entre pais e filhos, e sendo este o princípio norteador na configuração das novas entidades familiares.

Deste modo, se os pais desrespeitarem esses princípios em seu âmago mais intrínseco justificarão a possibilidade de destituição do poder familiar que lhes é conferida. Essa desoneração do poder familiar ocorre quando fica evidenciado, por exemplo, a prática de atos contrários aos bons costumes e a reiteração de condutas que mostrem a falta aos deveres inerentes ao poder familiar, além da imposição de castigos imoderados e do abandono, conforme elenca o artigo 1.638 do Código Civil.

A identificação dessas condutas ocorre quando os pais não se preocupam com o melhor interesse dos filhos, vindo a ocorrer à destituição da sua função de guardião, perdendo o papel de pai ou de mãe, e ficando a criança ou adolescente com famílias substitutas ou sendo direcionadas para abrigos de adoção, na expectativa de ver o seu interesse priorizado.

             A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Na perspectiva da ilustre doutrinadora Maria Helena Diniz o instituto da adoção:

É o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independente de qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha. (DINIZ, 2009, p. 520)


Com a vigência da Constituição Federal de 1988, passa-se a assegurar a igualdade entre os filhos, consoante ao disposto no art. 227: “Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”.

E é partir da Carta Magna que a adoção passou a exigir sentença judicial, destacando-se objetivamente o art. 1.619 do Código Civil de 2002 o art. 47 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

E no art. 227, § 5º, da Constituição Federal, ao dispor que “a adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros”, evidencia que a matéria em questão agora se de interesse geral, sendo matéria de ordem pública. Nas palavras do doutrinador Carlos Roberto Gonçalves:

A adoção não mais estampa o caráter contratualista de outrora, como ato praticado entre adotante e adotado, pois, em consonância com o preceito constitucional mencionado, o legislador ordinário ditará as regras segundo as quais o Poder Público dará assistência aos atos de adoção. (GONÇALVES, 2017, p. 489)

E atua no mesmo sentido o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que regulamenta a intermediação e autorização das adoções pelo poder judiciário, passando a ser imprescindíveis no caso de crianças e adolescentes, deixando desse modo de existir a modalidade de adoção que antes conhecíamos como simples. Tendo agora em seu pojo um caráter de natureza institucional e possuindo um caráter mais formalista.

  
            A AFETIVIDADE COMO PRINCÍPIO FUNDAMENTAL IMPLÍCITO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL



                  O JULGADO EM COMENTO


Conforme analisamos anteriormente, percebemos atualmente que os pais devem prestar contas à sociedade e ao Estado sobre as ações realizadas quanto ao poder familiar exercido sob a sua prole ainda menor. Todavia, se esse poder não for praticado de forma adequada poderá ensejar na destituição desse direito/dever atribuído a eles, assemelhando-se a uma determinada medida punitiva que visa corrigir àqueles que faltaram com a devida proteção aos filhos.

No Estado Acre, na Comarca de Rio Branco, mais especificamente na 2ª Vara da Infância e da Juventude, proferiu o juiz de Direito Romário Faria, titular da Unidade Judiciária, decisão que atendia ao pedido arguido por um padrasto que desejava o reconhecimento do vínculo parental com sua enteada menor de idade.

Ao autorizar a adoção da enteada, com 10 anos, o juiz por meio de sentença permitiu que esta seja reconhecida civilmente como filha e receba por sua vez o sobrenome do pai adotante.

O juiz também destituiu o poder familiar exercido pelo pai biológico da criança, mas manteve o vínculo existente entre a mãe (biológica) e filha, que após separar-se do pai biológico casou-se com o requerente.

Há época o padrasto da criança ingressou em juízo com ação de adoção unilateral e destituição do poder familiar do pai biológico, para isso alegou que criava a menina como sua filha e que convivia com ela há mais de seis anos, exercendo plenamente o papel de pai desde o momento em que se casou com a mãe da menor, dando-lhe sem restrições carinho, amor e afeto, além do sustento necessário para sua criação, e por ter a criança manifestado o desejo de ser reconhecida como tal decidiu ele entrar com pedido.

Para Jackelline Fraga Pessanha o Princípio da Afetividade, crescente no direito de família, comtempla os liames do caso em tela, vez que:

A família é uma construção social formada por meio de regras sociais, jurídicas e culturais, que a transformou em base da sociedade sabendo-se que o amor é o elemento de ligação entre as pessoas, de forma pública, contínua e duradoura, firmado por laços de afeto. É a presença de um vínculo familiar baseado na afetividade, que gera uma entidade familiar merecedora de abrigo pelo Direito de Família, tornando-se um instituto, previsto no artigo 226 da Constituição Federal, que consagra a regra geral de inclusão de qualquer entidade que preencha os requisitos essenciais, quais sejam, a afetividade, a estabilidade e a ostensividade. Sendo, portanto, entidade familiar merecedora de tutela e proteção do Estado, haja vista ter tal entidade vínculo afetivo. (PESSANHA, 2011, pag. 4)

Partindo da análise do relatório que apontava para um prognóstico psicológico positivo decidiu o juiz por, mediante concordância da mãe da criança e com o desejo manifesto da menor nesse sentido, considerar a adoção satisfatória e legitima.

No caso em tela, segundo interpretação feita pelo magistrado sucedeu uma fortificação das relações de afeto, decorrente da longa convivência familiar possuída, na qual ambos se declaram como pai e filha, relação de afeto essa que não foi evidenciada entre o pai biológico e a criança.

Entendemos assim, que buscou garantir o magistrado, com base no que preconiza o ECA e a própria Constituinte, a prioridade do melhor interesse da menor, a

afetividade existe nas relações familiares, bem como a celeridade processual concedendo habilmente, por decisão judicial, a adoção pretendida.



                  DA ANÁLISE JURISPRUDENCIAL BRASILEIRA COM BASE NO CASO CONCRETO

Consideramos a temática escolhida para o presente artigo de extrema relevância, vez que se tornou atualmente indispensável à discussão da temática de destituição do poder familiar do pai biológico para que o padrasto possa adotar o seu enteado, ainda mais por tratar-se de inovação promovida dentro do âmbito do Direito  de família.

O Tribunal de Justiça de catarinense proferiu sentença no mesmo sentido que do pronunciado na justiça acreana, sendo o caso concreto bastante semelhante, tendo como eixo de discussão a disputa da guarda de menor entre pai afetivo e o pai biológico, prevalecendo à guarda para o pai afetivo, conforme emenda a seguir:


Ementa: PATERNIDADE SOCIOAFETIVA – PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE – MANTENÇA DA GUARDA COM O CASAL QUE VEM  CRIANDO  A  MENOR    ARTIGOS E 33 DO ECA – PEDIDO INICIAL PARCIALMENTE PROCEDENTE – ÔNUS SUCUMBENCIAIS MODIFICADOS – RECURSO PROVIDO.

Tendo como foco a paternidade socioafetiva, bem como os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e do melhor interesse do menor, cabe inquirir qual bem jurídico merece ser protegido em detrimento do outro: o direito do pai biológico que pugna pela guarda da filha, cuja conduta, durante mais de três anos, foi de inércia, ou a integridade psicológica da menor, para quem a retirada do seio de seu lar, dos cuidados de quem ela considera pais, equivaleria à morte dos mesmos. Não se busca legitimar a reprovável conduta daqueles que, mesmo justificados por sentimentos nobres como o amor, perpetram inverdades, nem se quer menosprezar a vontade do pai biológico  em ver sob sua guarda criança cujo sangue é composto também do seu. Mas, tendo como prisma a integridade psicológica da menor, não se pode entender

como justa e razoável sua retirada de lugar que considera seu lar e com pessoas que considera seus pais, lá criada desde os primeiros dias de vida, como medida protetiva ao direito daquele que, nada obstante tenha emprestado à criança seus dados genéticos, contribuiu decisivamente para a consolidação dos laços afetivos supra-referidos ”(TJ-SC, Relator: Sergio Izidoro Heil, Data de Julgamneto: 01/06/2016, Terceira Câmara de Direito Civil)

Entendemos nesse mesmo sentido, sendo plenamente possível se admitir a proposição de ação referente à perda do poder familiar por qualquer pessoa dotada de legítimo interesse, pois como já sabemos, nada esclarece a lei ao falar sobre legitimidade, vez que o Estatuto da Criança e do Adolescente se selênica sobre.

A Corte Especial, em julgado do Superior Tribunal de Justiça (STJ), admitiu a possibilidade de o padrasto ocupar o polo ativo da ação de destituição do poder familiar do pai biológico. A presente decisão foi embasada no princípio da afetividade, destacando que o padrasto se equiparava legalmente ao legitimamente interessado, com base no que dispõe o art. 155 do ECA, ao pleitear  a  adoção  do menor.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA - STJ, TERCEIRA TURMA - RESP 1.106.637-SP-200802608928.

Cuida-se de ação de adoção com pedido preparatório de destituição do poder familiar ajuizada por padrasto de filha menor de sua esposa, com quem tem outra filha. A questão posta no REsp consiste em definir se o padrasto detém legitimidade ativa e interesse de agir para propor a destituição do poder familiar do pai biológico em caráter preparatório à adoção de  menor.  É  cediço que o art. 155 do ECA dispõe que o procedimento para a perda do  poder familiar terá início por provocação do MP ou de pessoa dotada de legítimo interesse. Por outro lado, o pedido de adoção formulado nos autos funda-se no art. 41, § 1º, do ECA, o qual corresponde ao art. 1.626, parágrafo único, do CC/2002: um dos cônjuges pretende adotar o filho do outro, o que permite ao padrasto invocar o legítimo interesse para a destituição do poder familiar do pai biológico devido à convivência  familiar,  ligada  essencialmente à paternidade social ou socioafetividade, que, segundo a doutrina, seria o convívio de carinho e participação no desenvolvimento e formação da criança sem a concorrência do vínculo biológico. Para a Min. Relatora, o padrasto tem legítimo interesse amparado na socioafetividade, o

que confere a ele legitimidade ativa e interesse de agir para postular  destituição do poder familiar do pai biológico da criança. Entretanto ressalta que todas as circunstâncias deverão ser analisadas detidamente no curso do processo, com a necessária instrução probatória e amplo contraditório, determinando-se, também, a realização de estudo social ou, se possível, de perícia por equipe interprofissional, segundo estabelece o art. 162, § 1º, do ECA. Observa ser importante dar ao padrasto a oportunidade de discutir a questão em juízo, em procedimento contraditório (arts. 24 e 169 do  ECA),  sem se descuidar, também, de que sempre deverá prevalecer o  melhor  interesse da criança e as hipóteses autorizadoras da destituição do poder familiar, comprovadas conforme dispõe o art. 1.638 do CC/2002 c/c art. 24   do ECA, em que seja demonstrado o risco social e pessoal ou de ameaça de lesão aos direitos a que esteja sujeita a criança. Entre outros argumentos e doutrinas colacionados, somadas às peculiaridades do processo, a Min. Relatora, acompanhada pela Turma, reconheceu a legitimidade ativa do padrasto para o pleito de destituição em procedimento contraditório, confirmando a decisão exarada no acórdão recorrido. (STJ - REsp 1106637, SP, 200802608928, Relator(a). Min.  Nancy  Andrighi,Data  de  Julgamento em 01/06/2010, Terceira Turma, Data da Publicação. DJe 01.07.2010.)


O Recurso foi interposto pelo pai biológico da menor contra a ação proposta pelo padrasto que pleiteava o pedido de adoção da filha de sua esposa, com pedido de destituição do poder familiar deste, para que fosse decretada a perda do  poder familiar do genitor da menor, de acordo com o art. 155 do ECA.

O pai biológico alegou a ilegitimidade ativa do padrasto, afirmando que somente a mãe da menor ou um representante do Ministério Público possuíam legitimidade para propor, já que o ordenamento não previa legitimação para  esses casos.

Contudo, a decisão inicial do juiz foi mantida pela Ministra, que julgou com base no entendimento de que o pedido de adoção tem como base a relação afetiva que promove uma verdadeira entidade familiar, que goza de amor, carinho e cuidados. O entendimento da decisão proferida se embasou em uma prerrogativa antes não vislumbrada pelo direito brasileiro, o que acarretou diversos debates  e  questionamentos, trazendo desta forma, diversas discussões relevantes quanto ao tema

do reconhecimento ou não da legitimidade do padrasto no pedido preparatório de destituição do poder familiar.

Deste modo, com base no tema já explorado, vemos que é possível se caracterizar a legitimidade do padrasto, que movido pela afetividade gerada ansiava pelo reconhecimento do vínculo que promove a unidade e o fortalecimento  do  ambiente familiar.

4.   CONCLUSÃO

Um histórico de ruptura e mudança de paradigmas pode dar subsídio para que possamos compreender de onde partimos e para onde estamos indo, nos permitindo promover uma reflexão de onde queremos chegar. Acompanhemos, assim, esse debate com a esperança de que toda a sociedade possa se beneficiar das mudanças inseridas no contexto da entidade familiar.

Desse modo, entendemos que a paternidade socioafetiva é uma espécie de paternidade em que não existe um vínculo de sangue ou adoção em si mesma, mas um vínculo de pai e filho, que surge do carinho e do amor gerado entre ambos.

Fala-se aqui de um vínculo que já é reconhecido pela sociedade, decorrente de comportamentos e sentimentos que traduzem a afetividade existente entre aqueles que se consideram família no mais intimo foram da sua concepção.

E é por esse motivo que muitas instituições e órgãos ligados à adoção têm se dedicado a intensos debates a respeito das dificuldades e dos avanços vivenciados no âmbito social e legal.

Assim, o principal objetivo desse artigo foi mostrar de forma breve a evolução, de maneira ampla, do instituto da adoção, as prerrogativas dele decorrentes e a destituição do poder familiar em decorrência da adoção socioafetiva, numa abordagem dinâmica em que prevalecem os direitos da criança e dos adolescentes, sem deixar de lado o importante papel desempenhado pelos pais, estres que são figuras indispensáveis para o desenvolvimento da entidade familiar, contudo visando-se sempre a proteção e a garantia dos direitos que devem ser respeitados, levando-se em consideração sempre o bem estar da criança e do adolescente.

Diante dessa premissa, tornou-se indispensável destacar-se a importante decisão proferida pelo juízo singular na justiça acreana, um verdadeiro precedente que abre portas oportunas para o novo, para a mudança imperativa que com toda coerência jurídica acompanha a evolução social das famílias brasileiras.



REFERÊNCIA

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. Ed. 5. São Paulo: Editora Saraiva, 2009.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito de família, v. 6, Ed.
14. Editora: Saraiva, 2017.

PESSANHA, Jackelline Fraga. IBDFAM/Artigo Cientifico: A Afetividade como Princípio Fundamental para a Estruturação Familiar. 2011.

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