Mirna Justa Nogueira
Junior Monte
Prof. Dr. Clóvis Augusto Cabral Ferreira
RESUMO: O presente artigo cientifico tem como objeto de estudo o instituto
da adoção em decorrência da perda do
poder familiar, bem como a sua importância no âmbito do Direito de Família, no
que tange ao melhor interesse da criança e do adolescente, sendo estes aqueles
que mais precisam de cuidados, proteção, afeto e orientação. Pretende-se
apresentar aqui jurisprudências inovadoras que foram proferidas nos últimos
anos, principalmente pela Justiça Acreana, em caso fático, onde o padrasto/pai
afetivo ao invocar os princípios da dignidade humana e da afetividade e de
melhor interesse da criança pode ver garantida a manutenção/estabelecimento dos
vínculos parentais pelo reconhecimento de decisão judicial que retirou o poder
familiar exercido pelo pai biológico. Para alcançar tal objetivo buscou-se
utilizar metodologicamente de pesquisas doutrinarias e jurisprudenciais que
reconhecem as mudanças sociedade e tratam especificamente sobre os reflexos que
os novos arranjos familiares tem trazido para o âmbito do Direito de Família.
PALAVRAS-CHAVES: Adoção, Poder
Familiar, Afetividade, Inovação, Justiça.
The present scientific article has as object of study
the institute of the adoption as a result of the loss of family power, as well
as its importance in the scope of Family Law, in what concerns the best
interest of the child and the adolescent, being these the ones that more need
care, protection, affection and guidance. It is intended to present here
innovative jurisprudence that has been pronounced in recent years, mainly by
Acreana Justice, in a factual case, where the stepfather / affective father,
invoking the principles of human dignity and affection and of the best interest
of the child can be guaranteed maintenance / establishment of parental bonds
for the recognition of a court decision
that removed the family power exercised by the
biological father. In order to achieve this objective, we sought to use
methodological studies of doctrinal and jurisprudential that recognize the
changes society and specifically deal with the reflexes that the new family
arrangements has brought to the scope of Family Law
KEYWORDS: Adoption, Family
Power, Affectivity, Innovation, Justice.
2.
INTRODUÇÃO
A palavra adoção deriva do latim adoptare, que significa o ato de
escolher, de dar a seu nome a alguém, já o poder familiar é um instituto do
Direito de Família, o qual era conhecido
como pátrio poder, chamado no Direito Romano de pater potestas, sendo o direito absoluto e ilimitado conferido ao
chefe da organização familiar sobre a pessoa dos filhos.
Atualmente, o instituto da adoção,
sob o aspecto jurídico, pode ser conceituado como ato jurídico solene pelo qual
se cria um laço de filiação entre duas pessoas, com total desligamento do
adotando de sua família biológica.
Mas é importante lembrar que até o
século XX a adoção em nosso país não era regulamentada juridicamente, sendo o
acesso ainda mais restrito, desse modo apenas os casais que não possuíam filhos
biológicos é que de fato poderiam fazê-lo, e isso ocorria por meio da entrega
de uma criança que fora deixada na Roda
dos Expostos, onde eram abandonadas crianças até sete anos de idade e a
última roda de nosso país ocorreu em meados de 1950 com o fechamento de tais
instituições.
Esse costume deixava os casais e as
crianças em situação de vulnerabilidade, pois nenhum direito sobre a adoção
lhes era de fato assegurado. As crianças, por exemplo, não podiam receber
herança de seus pais, a não ser que a família recorresse ao poder judiciário e, em audiência, o juiz
confirmasse o interesse de ambos na adoção.
Por volta do século XIX e início do
século XX, algumas políticas públicas começam a ser criadas, sendo direcionadas
objetivamente à proteção das crianças. Em 1916 é promulgada a Lei 3.071.16 que
versava sobre o instituto da adoção, tal lei buscou regulamentava que a adoção somente
poderia se dar nos moldes
determinados
legalmente, como diferença de idade mínima de 18 anos,
casamento civil para os que se consideravam casados, restringindo assim as
possibilidades de pleito, deste modo só se adequavam aos critérios determinados
os casais ou pessoas sem filhos, que tivessem idade mínima de 50 anos.
Previa ainda duas possibilidades de
desfazimento do vínculo familiar, um se caso ambos assim concordassem, tendo a
criança adotada atingido sua maior idade e outro em razão de ingratidão do
adotado contra o adotante, o que não era esclarecido por lei, sendo diversos os
critérios possíveis para isso.
Somente após quarenta anos é que a Lei 3.133 de
1957 trouxe mudanças importantes para o
instituto da adoção, como a irrevogabilidade da adoção, isto é, ela não poderia
mais ser desfeita, o desfazimento de vínculos com a família biológica, além
permitiu a adoção por pessoas de 30 anos de idade, tivessem ou não prole
natural.
O legislador passou a facilitar os
processos de adoção, possibilitando que um maior número de pessoas, sendo
adotado, experimentasse melhoria na sua condição moral e social, mas embora
concedesse a adoção para casais que já tivessem filhos legítimos, legitimados
ou reconhecidos, não equiparava a estes aos adotados, não se envolvendo aqui
questões de sucessão hereditária.
Após isso, a Lei n. 4.655/65, nas palavras do doutrinador Carlos Roberto
Gonçalves:
(...) introduziu no ordenamento brasileiro a “legitimação
adotiva”, como proteção ao menor abandonado, com a vantagem de estabelecer um
vínculo de parentesco de primeiro grau, em linha reta, entre adotante e
adotado, desligando-o dos laços que o prendiam à família de sangue mediante a
inscrição da sentença concessiva da legitimação, por mandado, no Registro
Civil, como se os adotantes tivessem realmente tido um filho natural e se
tratasse de registro fora do prazo (art. 6º) (GONÇALVES, 2017, p.492)
As atenções do poder público
continuaram voltadas para a infância, e em 1979,
o Código de Menores é publicado, Lei
n. 6.697/79. A adoção passa a ser incluída agora como uma medida protetiva
da infância, não sendo encontrada dentro do direito de família. O ilustre
doutrinador ainda aduz que:
Ao lado da forma tradicional do Código Civil, denominada
“adoção simples”, passou a existir, com o advento do mencionado Código de
Menores de 1979, a “adoção plena”, mais abrangente, mas aplicável somente ao
menor em “situação irregular”. Enquanto a primeira dava origem a um parentesco
civil somente entre adotante e adotado sem desvincular o último da sua família
de sangue, era revogável pela vontade das partes e não extinguia os direitos e
deveres resultantes do parentesco natural, como foi dito, a adoção plena, ao
contrário, possibilitava que o adotado ingressasse na família do adotante como
se fosse filho de sangue, modificando-se o seu assento de nascimento para esse
fim, de modo a apagar o anterior parentesco com a família natural. (GONÇALVES,
2017, p.492)
Por fim, com a vigência da Lei n. 8.069/90, o conhecido Estatuto
da Criança e do Adolescente promoveu uma nova mudança para fins de
regulamentação do instituto da adoção, trazendo como principal alteração a
regra de que a adoção seria sempre plena
para os menores de 18 anos, e a adoção simples ficaria reservada aos que já
houvessem completado essa idade, sendo denominadas como adoção civil e adoção
estatutária. Atualmente é a Lei n.
12.010/ 09 que rege o processo de adoção de crianças e adolescentes.
3.
UMA MUDANÇA DE PARADIGMA NO
DIREITO DE FAMILIA
O Direito de Família vem se
adaptando aos novos modelos de constituição familiar, não sendo diferente em
relação à função do poder familiar, que ao não ser exercido com
responsabilidade pode ser retirado daqueles que tem o dever de cuidar, proteger
e zelar pelo bem estar do menor.
Sendo assim, o exercício do poder
familiar deve ser guiado pelos princípios que regem o Direito de Família e o
estatuto da criança e do adolescente, levando assim em consideração não apenas
a dignidade da pessoa humana, a igualdade, respeito, a diferença e a liberdade,
mas também a proteção integral a criança e do adolescente, evitando-se o
retrocesso familiar e elucidando cada vez mais a afetividade existente entre
pais e filhos, e sendo este o princípio norteador na configuração das novas
entidades familiares.
Deste modo, se os pais
desrespeitarem esses princípios em seu âmago mais intrínseco justificarão a
possibilidade de destituição do poder familiar que lhes é conferida. Essa
desoneração do poder familiar ocorre quando fica evidenciado, por exemplo, a
prática de atos contrários aos bons costumes e a reiteração de condutas que
mostrem a falta aos deveres inerentes ao poder familiar, além da imposição de
castigos imoderados e do abandono, conforme elenca o artigo 1.638 do Código Civil.
A identificação dessas condutas
ocorre quando os pais não se preocupam com o melhor interesse dos filhos, vindo
a ocorrer à destituição da sua função de guardião, perdendo o papel de pai ou
de mãe, e ficando a criança ou adolescente com famílias substitutas ou sendo
direcionadas para abrigos de adoção, na expectativa de ver o seu interesse priorizado.
A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E O
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Na perspectiva da ilustre doutrinadora Maria Helena Diniz o
instituto da adoção:
É
o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém
estabelece, independente de qualquer relação de parentesco consanguíneo ou
afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição
de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha. (DINIZ, 2009, p. 520)
Com a vigência da Constituição Federal de 1988,
passa-se a assegurar a igualdade entre os filhos, consoante ao disposto no art.
227: “Os filhos, havidos ou não
da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e
qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à
filiação”.
E é partir da Carta Magna que a
adoção passou a exigir sentença judicial, destacando-se objetivamente o art.
1.619 do Código Civil de 2002 o art. 47 do Estatuto da Criança e do
Adolescente.
E no art. 227,
§ 5º, da Constituição Federal, ao dispor que “a adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que
estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros”,
evidencia que a matéria em questão agora se de interesse geral, sendo matéria
de ordem pública. Nas palavras do doutrinador Carlos Roberto Gonçalves:
A adoção não mais estampa o caráter contratualista de
outrora, como ato praticado entre adotante e adotado, pois, em consonância com
o preceito constitucional mencionado, o legislador ordinário ditará as regras
segundo as quais o Poder Público dará assistência aos atos de adoção.
(GONÇALVES, 2017, p. 489)
E atua no mesmo sentido o Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA), que regulamenta a intermediação e
autorização das adoções pelo poder judiciário, passando a ser imprescindíveis
no caso de crianças e adolescentes, deixando desse modo de existir a modalidade
de adoção que antes conhecíamos como simples. Tendo agora em seu pojo um
caráter de natureza institucional e possuindo um caráter mais formalista.
A AFETIVIDADE COMO PRINCÍPIO FUNDAMENTAL IMPLÍCITO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
O JULGADO EM COMENTO
Conforme analisamos anteriormente,
percebemos atualmente que os pais devem prestar contas à sociedade e ao Estado
sobre as ações realizadas quanto ao poder familiar exercido sob a sua prole
ainda menor. Todavia, se esse poder não for praticado de forma adequada poderá
ensejar na destituição desse direito/dever atribuído a eles, assemelhando-se a
uma determinada medida punitiva que visa corrigir àqueles que faltaram com a
devida proteção aos filhos.
No Estado Acre, na Comarca de Rio
Branco, mais especificamente na 2ª Vara da Infância e da Juventude, proferiu o
juiz de Direito Romário Faria, titular da Unidade Judiciária, decisão que
atendia ao pedido arguido por um padrasto que desejava o reconhecimento do
vínculo parental com sua enteada menor de idade.
Ao autorizar a adoção da enteada,
com 10 anos, o juiz por meio de sentença permitiu que esta seja reconhecida
civilmente como filha e receba por sua vez o sobrenome do pai adotante.
O juiz também destituiu o poder
familiar exercido pelo pai biológico da criança, mas manteve o vínculo
existente entre a mãe (biológica) e filha, que após separar-se do pai biológico
casou-se com o requerente.
Há época o padrasto da criança
ingressou em juízo com ação de adoção
unilateral e destituição do poder familiar do pai biológico, para isso
alegou que criava a menina como sua filha e que convivia com ela há mais de
seis anos, exercendo plenamente o papel de pai desde o momento em que se casou
com a mãe da menor, dando-lhe sem restrições carinho, amor e afeto, além do
sustento necessário para sua criação, e por ter a criança manifestado o desejo
de ser reconhecida como tal decidiu ele entrar com pedido.
Para Jackelline Fraga Pessanha o
Princípio da Afetividade, crescente no direito de família, comtempla os liames
do caso em tela, vez que:
A
família é uma construção social formada por meio de regras sociais, jurídicas e
culturais, que a transformou em base da sociedade sabendo-se que o amor é o
elemento de ligação entre as pessoas, de forma pública, contínua e duradoura,
firmado por laços de afeto. É a presença de um vínculo familiar baseado na
afetividade, que gera uma entidade familiar merecedora de abrigo pelo Direito
de Família, tornando-se um instituto, previsto no artigo 226 da Constituição
Federal, que consagra a regra geral de inclusão de qualquer entidade que
preencha os requisitos essenciais, quais sejam, a afetividade, a estabilidade e
a ostensividade. Sendo, portanto, entidade familiar merecedora de tutela e
proteção do Estado, haja vista ter tal entidade vínculo afetivo. (PESSANHA,
2011, pag. 4)
Partindo da análise do relatório que
apontava para um prognóstico psicológico positivo decidiu o juiz por, mediante
concordância da mãe da criança e com o desejo manifesto da menor nesse sentido,
considerar a adoção satisfatória e legitima.
No caso em tela, segundo
interpretação feita pelo magistrado sucedeu uma fortificação das relações de
afeto, decorrente da longa convivência familiar possuída, na qual ambos se
declaram como pai e filha, relação de afeto essa que não foi evidenciada entre o
pai biológico e a criança.
Entendemos assim, que buscou garantir
o magistrado, com base no que preconiza o ECA e a própria Constituinte, a
prioridade do melhor interesse da menor, a
afetividade
existe nas relações familiares, bem como a celeridade processual concedendo
habilmente, por decisão judicial, a adoção pretendida.
DA ANÁLISE JURISPRUDENCIAL
BRASILEIRA COM BASE NO CASO CONCRETO
Consideramos a temática escolhida
para o presente artigo de extrema relevância, vez que se tornou atualmente
indispensável à discussão da temática de destituição do poder familiar do pai
biológico para que o padrasto possa adotar o seu enteado, ainda mais por
tratar-se de inovação promovida dentro do âmbito do Direito de família.
O Tribunal de Justiça de catarinense
proferiu sentença no mesmo sentido que do pronunciado na justiça acreana, sendo
o caso concreto bastante semelhante, tendo como eixo de discussão a disputa da
guarda de menor entre pai afetivo e o pai biológico, prevalecendo à guarda para
o pai afetivo, conforme emenda a seguir:
“Ementa: PATERNIDADE SOCIOAFETIVA – PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA
RAZOABILIDADE – MANTENÇA DA GUARDA COM O CASAL QUE VEM CRIANDO
A MENOR –
ARTIGOS 6º E
33 DO
ECA –
PEDIDO INICIAL PARCIALMENTE PROCEDENTE – ÔNUS SUCUMBENCIAIS MODIFICADOS –
RECURSO PROVIDO.
Tendo como foco a
paternidade socioafetiva, bem como os princípios da proporcionalidade, da
razoabilidade e do melhor interesse do menor, cabe inquirir qual bem jurídico
merece ser protegido em detrimento do outro: o direito do pai biológico que
pugna pela guarda da filha, cuja conduta, durante mais de três anos, foi de inércia,
ou a integridade psicológica da menor, para quem a retirada do seio de seu lar,
dos cuidados de quem ela considera pais, equivaleria à morte dos mesmos. Não se
busca legitimar a reprovável conduta daqueles que, mesmo justificados por
sentimentos nobres como o amor, perpetram inverdades, nem se quer menosprezar a
vontade do pai biológico em ver sob sua
guarda criança cujo sangue é composto também do seu. Mas, tendo como prisma a integridade psicológica da menor, não se pode entender
como justa e razoável sua
retirada de lugar que considera seu lar e com pessoas que considera seus pais,
lá criada desde os primeiros dias de vida, como medida protetiva ao direito
daquele que, nada obstante tenha emprestado à criança seus dados genéticos, contribuiu
decisivamente para a consolidação dos laços afetivos supra-referidos ”(TJ-SC,
Relator: Sergio Izidoro Heil, Data de Julgamneto: 01/06/2016, Terceira Câmara
de Direito Civil)
Entendemos nesse mesmo sentido, sendo
plenamente possível se admitir a proposição de ação referente à perda do poder
familiar por qualquer pessoa dotada de legítimo interesse, pois como já
sabemos, nada esclarece a lei ao falar sobre legitimidade, vez que o Estatuto
da Criança e do Adolescente se selênica sobre.
A Corte Especial, em julgado do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), admitiu a possibilidade de o padrasto
ocupar o polo ativo da ação de destituição do poder familiar do pai biológico.
A presente decisão foi embasada no princípio da afetividade, destacando que o
padrasto se equiparava legalmente ao legitimamente interessado, com base no que
dispõe o art. 155 do ECA, ao pleitear
a adoção do menor.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA - STJ,
TERCEIRA TURMA - RESP 1.106.637-SP-200802608928.
Cuida-se de ação de adoção com pedido preparatório de destituição do poder familiar ajuizada por
padrasto de filha menor de sua esposa, com quem tem outra filha. A questão posta no REsp consiste em definir se o
padrasto detém legitimidade ativa e interesse de agir para propor a destituição
do poder familiar do pai biológico em caráter preparatório à adoção de menor.
É cediço que o art. 155 do ECA
dispõe que o procedimento para a perda do
poder familiar terá início por provocação do MP ou de pessoa dotada de
legítimo interesse. Por outro lado, o pedido de adoção formulado nos autos
funda-se no art. 41, § 1º, do ECA, o qual corresponde ao art. 1.626, parágrafo
único, do CC/2002: um dos cônjuges pretende
adotar o filho do outro, o que permite ao padrasto invocar o legítimo interesse
para a destituição do poder familiar do pai biológico devido à convivência familiar,
ligada essencialmente à
paternidade social ou socioafetividade, que, segundo a doutrina, seria o
convívio de carinho e participação no desenvolvimento e formação da criança sem
a concorrência do vínculo biológico. Para a Min. Relatora, o padrasto tem legítimo interesse
amparado na socioafetividade, o
que confere a ele legitimidade ativa e interesse de agir para
postular destituição do poder familiar
do pai biológico da criança. Entretanto ressalta que todas as circunstâncias
deverão ser analisadas detidamente no curso do processo, com a necessária
instrução probatória e amplo contraditório, determinando-se,
também, a realização de estudo social ou, se possível, de perícia por equipe
interprofissional, segundo estabelece o art. 162, § 1º, do ECA. Observa ser
importante dar ao padrasto a oportunidade de discutir a questão em juízo, em
procedimento contraditório (arts. 24 e 169 do
ECA), sem se descuidar, também,
de que sempre deverá prevalecer o
melhor interesse da criança e as
hipóteses autorizadoras da destituição do poder familiar, comprovadas conforme
dispõe o art. 1.638 do CC/2002 c/c art.
24 do ECA, em que seja demonstrado o risco social e pessoal ou de ameaça de
lesão aos direitos a que esteja sujeita a criança. Entre outros argumentos e
doutrinas colacionados, somadas às peculiaridades do processo, a Min. Relatora,
acompanhada pela Turma, reconheceu a
legitimidade ativa do padrasto para o pleito de destituição em procedimento
contraditório, confirmando a decisão exarada no acórdão recorrido. (STJ - REsp
1106637, SP, 200802608928, Relator(a). Min.
Nancy Andrighi,Data de Julgamento em 01/06/2010, Terceira Turma, Data da Publicação. DJe 01.07.2010.)
O Recurso foi interposto pelo pai
biológico da menor contra a ação proposta pelo padrasto que pleiteava o pedido
de adoção da filha de sua esposa, com pedido de destituição do poder familiar deste, para que fosse decretada a perda
do poder familiar do genitor da menor,
de acordo com o art. 155 do ECA.
O pai biológico alegou a
ilegitimidade ativa do padrasto, afirmando que somente a mãe da menor ou um
representante do Ministério Público possuíam legitimidade para propor, já que o
ordenamento não previa legitimação para
esses casos.
Contudo, a decisão inicial do juiz
foi mantida pela Ministra, que julgou com base no entendimento de que o pedido
de adoção tem como base a relação afetiva que promove uma verdadeira entidade
familiar, que goza de amor, carinho e cuidados.
O entendimento da decisão proferida se embasou em uma prerrogativa antes
não vislumbrada pelo direito brasileiro, o que acarretou diversos debates e
questionamentos, trazendo desta forma, diversas discussões relevantes
quanto ao tema
do
reconhecimento ou não da legitimidade do padrasto no pedido preparatório de
destituição do poder familiar.
Deste modo, com base no tema já explorado, vemos que é possível se
caracterizar a legitimidade do padrasto, que movido pela afetividade gerada
ansiava pelo reconhecimento do vínculo que promove a unidade e o
fortalecimento do ambiente familiar.
4.
CONCLUSÃO
Um histórico de ruptura e mudança de
paradigmas pode dar subsídio para que possamos compreender de onde partimos e
para onde estamos indo, nos permitindo promover uma reflexão de onde queremos
chegar. Acompanhemos, assim, esse debate com a esperança de que toda a
sociedade possa se beneficiar das mudanças inseridas no contexto da entidade
familiar.
Desse modo, entendemos que a
paternidade socioafetiva é uma espécie de paternidade em que não existe um
vínculo de sangue ou adoção em si mesma, mas um vínculo de pai e filho, que
surge do carinho e do amor gerado entre ambos.
Fala-se aqui de um vínculo que já é
reconhecido pela sociedade, decorrente de comportamentos e sentimentos que
traduzem a afetividade existente entre aqueles que se consideram família no mais
intimo foram da sua concepção.
E é por esse motivo que muitas
instituições e órgãos ligados à adoção têm se dedicado a intensos debates a
respeito das dificuldades e dos avanços vivenciados no âmbito social e legal.
Assim, o principal objetivo desse artigo
foi mostrar de forma breve a evolução, de maneira ampla, do instituto da
adoção, as prerrogativas dele decorrentes e a destituição do poder familiar em
decorrência da adoção socioafetiva, numa abordagem dinâmica em que prevalecem
os direitos da criança e dos adolescentes, sem deixar de lado o importante
papel desempenhado pelos pais, estres que são figuras indispensáveis para o
desenvolvimento da entidade familiar, contudo visando-se sempre a proteção e a
garantia dos direitos que devem ser respeitados, levando-se em consideração
sempre o bem estar da criança e do adolescente.
Diante dessa premissa, tornou-se
indispensável destacar-se a importante decisão proferida pelo juízo singular na
justiça acreana, um verdadeiro precedente que abre portas oportunas para o
novo, para a mudança imperativa que com toda coerência jurídica acompanha a
evolução social das famílias brasileiras.
REFERÊNCIA
DINIZ,
Maria Helena. Curso de Direito Civil
Brasileiro: Direito de Família. Ed. 5. São Paulo: Editora Saraiva, 2009.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito de família, v. 6, Ed.
14. Editora:
Saraiva, 2017.
PESSANHA,
Jackelline Fraga. IBDFAM/Artigo Cientifico: A Afetividade como
Princípio Fundamental para a Estruturação Familiar. 2011.
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