segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Artigo: Poder Judiciário do Estado do Acre e sua visão sobre sobre a união homoafetiva



Tereza Cristina Nobre de Alencar 
Ricardo Tomas Ferreira Pereira 
Faculdade da Amazônia Ocidental – FAAO 
rickardo_ferriera@hotmail.com






RESUMO 



O referido artigo visa explicitar o entendimento jurídico acreano à luz do reconhecimento da União Homoafetiva pelo Supremo Tribunal Federal. Especificando o grande avanço da matéria no Estado, rompendo barreiras ideológicas que ficaram no passado e concretizando em geral o princípio da igualdade e isonomia da sociedade como um todo. A metodologia utilizada consiste no método dedutivo, com análises bibliográficas, pesquisas nas jurisprudências e doutrinas de modo indireto. 

PALAVRAS-CHAVE: União homoafetiva; família. 

 


Para total compreensão deste artigo é de suma importância entender o conceito de família e suas modificações, haja vista que assim como o mundo está em constante evolução, o Direito também evolui fazendo valer o princípio da segurança jurídica e a preservação dos ideais da sociedade. Nessa esteira, o Judiciário Acreano também se apresenta favorável às modificações no conceito de família, reconhecendo a possibilidade de se firmarem uniões homoafetivas. 

Maria Helena Diniz discorre sobre família no sentido amplo como todos os indivíduos que estiverem ligados pelo vínculo da consanguinidade ou da afinidade, chegando a incluir estranhos. Já para Paulo Nader, família se equivale em “uma instituição social, composta por mais de uma pessoa física, que se irmanam no propósito de desenvolver, entre si, a solidariedade nos planos assistencial e da convivência ou simplesmente descendem uma da outra ou de um tronco comum”. 

Dos referidos conceitos podemos extrair que diferentemente dos primórdios sociais, as famílias já se formam simplesmente pelo afeto, por laços de amor, entrando em contraste com as crenças ortodoxas de que família se dá somente por laços de sangue. Compreende-se, também, do conceito atual de família, que é com base na união afetiva, que se verifica a união homoafetiva, haja vista que com base no afeto recíproco e no desejo de convivência dos indivíduos, se preenchem requisitos essenciais para uma relação estável. 

E é com base nessa orientação que o magistrado Júnior Alberto Ribeiro, Juiz de Direito da 3ª Vara da Família em julho de 2008, reconheceu a efetiva união homoafetiva estável de um casal, após a morte de um dos cônjuges, para fins legais e previdenciários como pode-se inferir no processo nº. 001.06.010641-8. No processo, o autor solicitou que reconhecessem a existência de sociedade familiar, alegando a relação tida pelo período de seis anos, até o falecimento do companheiro. Dessa maneira, o autor reivindicou seu direito de se habilitar ao recebimento de pensão. 

Por conseguinte, fisga-se que o MM reconheceu e aplicou todos os requisitos de um “casal normal”, aquele presente no artigo 1723 do Código Civil, versando: “surgem as relações homoafetivas, formadas por pessoas de mesmo sexo que se unem para conviver entre si, assumindo a posição de verdadeiros núcleos familiares, com o estabelecimento de coabitação comum, assistência mútua, respeito recíproco, fidelidade e formação de patrimônio a partir do esforço simultâneo de ambas as partes”. 

Dessa forma, é nítido que o Juiz Júnior Alberto Ribeiro agiu em consonância com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, onde o Supremo Tribunal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceram a união estável para casais do mesmo sexo, o julgamento conjunto da ADPF 132 e da ADI 4277 representou uma fidedigna quebra de arquétipos e um avanço para o Direito Familiar, assim como uma revolução para o Judiciário Acreano, haja vista que uma cidade tão pequena anda lado a lado, mesmo reconhecendo antecipadamente, já que a decisão Acreana foi prolatada em 2008 e a decisão do STF em 2011, é evidente que os preceitos assegurados constitucional e civilmente foram seguidos por todas as partes que proferiram o direito. Um julgamento público em uma área intrínseca da pessoa humana, condizente com a sua particularidade e suas uniões afetivo-sexuais. 

O Supremo Tribunal Federal concluiu que a união homoafetiva é agremiação familiar, e que dela derivam todos os direitos e obrigações que efluem da união fixa entre homem e mulher. Em vista disso, reconhecidos os requisitos legais para configuração da união estável, materializada na coexistência pública, continua e perdurável, com o desejo de formar uma família, casais homossexuais como afirma Enézio de Deus Silva Junior: "formam uniões estáveis aptas ao usufruto de todos os direitos e ao exercício de deveres decorrentes do mesmo sentimento: o amor". 

Depreende-se que o excelentíssimo magistrado Acreano deu um parecer eximiamente inteligente, coerente e revolucionário para o Estado, a luz do STF e, em consonância com a constante evolução global. O Legislativo falhou nesse quesito, o STF e a Justiça Acreana, não. 

Posto isso, é de suma importância analisarmos o voto do relator no julgamento do STF, pois ao fazer um passeio pelas entidades familiares constitucionalizadas, o Min. Ayres Britto iniciou pelo casamento civil, recapitulando que o mesmo já foi, porém não concebe mais a única forma de constituição de família genuína. Rememora também que a regulamentação do casamento é regrada pela CF, todavia sem referência aos substantivos "homem" e "mulher", como ocorre no instituto da união estável. Aliás, encerra o Ministro relator por captar que a presença da duplicidade de sexos na união estável se deve a um reforço regulamentário à ideia de que homens e mulheres são congêneres, rechaçando "a renitência patriarcal dos nossos costumes". 

Com base nos transcritos anteriores, é fácil abordar os princípios e garantias fundamentais que norteiam as relações familiares, pois a estandardização dos vínculos familiares é realizada pela principiologia constitucional em face dos preceitos de igualdade, legalidade, afetividade, isonomia e, essencialmente, do decoro da pessoa humana que, por ser um valor elementar, outorga homogeneidade teleológica a todos os princípios e diretrizes constitucionais e também infraconstitucionais. 

O princípio da isonomia acarreta em tratamento equânime de todos os indivíduos, sejam homossexuais ou heterossexuais, ou seja, como seres humanos possuem o direito de se vincularem com quem sentirem vontade, não devendo importar o seu apetite sexual, pois os homossexuais detêm a mesma prerrogativa que os heterossexuais de viver com outro indivíduo de forma afetiva, e ter esta união garantida juridicamente. 

Entendemos que, através deste princípio, os homossexuais, por serem menor parte na sociedade, carecem de ter até certo marco, tratamento desigual, tratamento dessemelhante dos casos diversos, à medida que se diferenciam, do resto da coletividade, mas não se arrazoa que eles se mantenham à margem do amanho jurídico. 

O ordenamento jurídico do Brasil não regimentou o vínculo entre indivíduos de sexo igual, porém não a proibiu, logicamente, nenhum homossexual poder ser privado de se unir a um outro com o desejo de coexistir afetivamente emanando uma família ou de erigir um legado junto ao seu companheiro. Como não foi a união entre indivíduos de mesmo sexo vedada de forma expressa pelo constituinte, resta concluir pela viabilidade jurídica de condecoração deste tipo de união. Todavia, toda ação possui uma reação, e serão, agora, analisadas algumas consequências do reconhecimento da união homoafetiva. 

A prática social tem exposto a vivência de pessoas do mesmo sexo convivendo como parceiros, levando uma vida de casados. A transformação do direito deve seguir as evoluções sociais, a partir de casos materiais que afeiçoem novas realidades nas relações entre pessoas. O princípio da igualdade previsto nos artigos 3º, inciso IV e 5º da Constituição Federal, extinguiu de forma definitiva, toda e qualquer forma de discriminação. Uma das metas presentes na disciplina dos direitos fundamentais, entre os mais conceituados pela doutrina, é o de garantir a não discriminação, de tal maneira, o referido princípio constitucional deve se aplicar a todos os direitos, abrangendo, ainda, os privilégios e prerrogativas individuais. 

A não existência de regulamentação não pode ser supina a padrão de impedimento para a condecoração de êxitos jurídicos que resultem de fato relevante conhecido pela sociedade em geral. Como sabemos, não são em todos os casos que a evolução do Legislativo acompanha as constantes mutações da sociedade. Cabe, então, ao Judiciário, valendo-se dos princípios exegeses, suplementar os hiatos existentes na lei, amoldando-as às carências sociais. 

Por conseguinte, não se pode vedar a visão crítica e social para tentar crer que as parentelas homoparentais, por não apresentarem capacidade de se reproduzirem, simplesmente não podem ter filhos. O Judiciário Acreano, já em 2008, se mostrou ciente da existência cada vez mais hodierna que são crianças e jovens que vivem em um lar homossexual. Logo, infere-se que tanto crianças e adolescentes, assim como parceiros homossexuais buscam a consumação do sonho de organizarem uma família com a presença de filhos. Não enxergar essa realidade é dar vasão ao mecanismo da invisibilidade para adotar uma postura discriminatória. 

Uma possibilidade cada vez mais presente na sociedade, é de um dos parceiros (as) se submeter à uma procriação assistida. Este será o pai ou a mãe. O companheiro ou companheira, não envolvido no processo conceptivo, fica supresso da relação de parentesco, ainda que o filho tenha surgido através da vontade de ambos. Nessas hipóteses, o pai ou a mãe consanguínea é somente um do casal, mesmo que o filho tenha sido concebido por processo do qual ambos participaram. O mais relevante aqui é o surgimento da função de pai ou mãe não dependendo de um referencial ortodoxo, ligados ao sexo dos possíveis pais. 

O tema abordado ainda é considerado polêmico em solo acreano, porém não podemos permitir que se negue a sua relevância e que os operadores do Direito devem estar sempre adeptos às transformações sociais para que o Direito possa suprir às necessidades da coletividade em geral. Não seria correto, muito menos justo que após uma união de seis anos da qual se adquiriram bens, havendo rompimento desta união o outro que o auxiliou a construir um patrimônio não seja contemplado na cota que lhe pertence por direito, mesmo que não tivesse lei que a estipulasse. E foi nesse diapasão que o Judiciário Acreano revolucionou e deu exemplo a cidades que destoam do entendimento do STF, assegurando ao autor da ação a igualdade de condições em relação aos outros dependentes da cota pensionária deixada pelo falecido. 






REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 



CRUZ, Cleidiana da Conceição; SILVA, Nayara Maria Pereira da. A legitimidade da decisão do STF a favor da união homoafetiva frente aos anseios de uma sociedade plural. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 91, ago 2011. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10012>. Acesso em julho 2018. 

HAIDAR, Rodrigo. Supremo Tribunal Federal reconhece união estável homoafetiva. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2011-mai-05/supremo-tribunal-federal-reconhece-uniao-estavel-homoafetiva> Acesso em: julho de 2018. 

Jurisprudência do STF. União homoafetiva como entidade familiar. Disponível em: <http://www2.stf.jus.br/portalStfInternacional/cms/destaquesNewsletter.php?sigla=newsletterPortalInternacionalJurisprudencia&idConteudo=193683> Acesso em: junho de 2018. 

LYCHOWSKI, Rodrigo. A decisão do STF sobre a união estável homoafetiva: breve comentário. Disponível em: <https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/6426/A-decisao-do-STF-sobre-a-uniao-estavel-homoafetiva-breve-comentario> Acesso em: julho de 2018. 

Notícias do STF. Supremo reconhece união homoafetiva. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178931> Acesso em: junho de 2018. 

Poder Judiciário do Estado do Acre. Justiça reconhece união homoafetiva. Disponível em: <https://www.tjac.jus.br/noticias/justica-reconhece-uniao-homoafetiva/> Acesso em: junho de 2018.

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